Nos anos 70, 80 e 90 duas lojas disputavam a primazia de ter os melhores lançamentos importados e nacionais - a Baratos Afins e a Wop-Bop. Essa última tinha como um dos proprietários, René Ferri, amante de música, homem de fala mansa e tímido. Tão tímido que nem quis fornecer uma foto para essa matéria, me obrigando a colocar várias fotos de discos no lugar. As duas lojas também montaram seus selos e promoveram várias bandas nos anos 80. No caso da Wop-Bop, o primeiro EP do Violeta de Outono, Amor do Louco, do Fellini, Tabaporã de May East e o primeiro do Vzyadoq Moe. Meu primeiro contato com René em sua loja aconteceu em 1988 quando fui comprar o cassete Early Years, que ainda vinha com um fanzine e um flexi-disc de Fabio Golfetti. Pouco tempo depois, a loja fechou e René foi cuidar da vida com outras coisas. Mas o charme da loja permanece, tanto que muitos saudosistas dela freqüentam uma comunidade no orkut. Conheça um pouco mais dessa figura emblemática do rock paulista...
Eu foi frequentador desta loja nos ano 70'', boa parte da minha coleção em vinil foi comprada pelas mão do Rene e o Antonio, a coisa que mais lembro daquela época foi quando fui comprar na época acho que um dos grandes lançamentos o LP do Led Zeppelin "Physical Graffiti", cheguei antes da loja abrir e ja estava uma galera esperando chegar, o Rene acho que não acreditou ele chegando com as caixas com os LP's e todo mundo no maior ouriço para pegar o seu, bons tempos aqueles.
Dando uma olhada na net, achei uma entrevista com o Rene no site MOFO, que coloco abaixo para quem queira ler sobre esta figura que deve ser lembrada:
Pergunta: - Conte um pouco a história da loja. Em que ano começou e em que ano fechou, e por qual motivo...
René Ferri: - Vou tentar... Em 1974, achei que havia espaço, em São Paulo, para a existência de uma loja que atendesse principalmente pessoas que, assim como eu, quisessem adquirir discos fora de catálogo, discos usados, mas limpos e bem cuidados, e que tivesse uma direção voltada para a qualidade da música. As lojas de discos usados que havia então eram de sucateiros, que amontoavam os discos sem qualquer ordem, discos riscados, quebrados, sem as capas... Para minha sorte, o Antonio Albuquerque, que conheci àquela época, pensava a mesma coisa e, assim, com a irresponsabilidade dos mais jovens, deixamos nossos empregos regulares e entramos nessa aventura, encarando um ramo do comércio que sequer existia. Devo dizer que se não fosse o Antonio a Wop-Bop não teria acontecido. Tenho idéias razoáveis mas sou nulo em iniciativa, não tenho capacidade de organização e não tenho a mínima ambição. O Antonio deu o nome à loja, por exemplo; se dependesse somente de mim se chamaria algo como "Casa de Discos Sta. Izildinha", por absoluta falta de senso e tino comercial. Aí fizemos a loucura de alugar uma saleta, no 2º andar de um prédio decadente, a tal Grandes Galerias. O 2º andar, então, tinha ocupação de uns 20% no máximo, dali para cima era tudo deserto. Para baixo era um tanto melhor, uns 50 ou 60% de ocupação no 1º andar, e o térreo e subsolo com uns 80% ocupados. Nenhuma escada rolante funcionava, os elevadores funcionavam muito precariamente. Abrimos a Wop-Bop em 1975. Chamamos os amigos e conhecidos. O que deu o impulso e fez a coisa dar certo foi uma divulgação feita com panfletos nas portas de teatros e cinemas, escolas, e onde quer que acontecessem os shows descolados da época. Esse trabalho de divulgação, verdadeiro corpo a corpo, foi feito pelo Dudu Richard, um amigo que não vejo há décadas. Aí os meninos começaram a chegar, com os discos debaixo do braço. Trocávamos discos porque eu sabia por experiência própria que quem compra muito disco acaba com vários que não gosta ou deixou de gostar. Isso funcionou muito bem. O garoto chegava lá com dois discos que odiava e saía com um que queria comprar. Gastava-se pouco e a satisfação era enorme. Os meninos que sequer conheciam a Grandes Galerias, ao passar a freqüentar a Wop-Bop devolveram aquele prédio condenado à vida; eles salvaram a Grandes Galerias que apenas quatro anos depois já começava a ser conhecida como ‘Galeria do Rock’. Um dia, um dos nossos novos amigos, o Cris (que veio a ser músico da cena oi! em Londres, nos anos 80), cismou de passar uns super8 dos Beatles na loja. Esperávamos umas 20 pessoas no máximo, mas apareceram umas 200! Ali percebemos que a Wop-Bop havia dado certo. Quatro anos depois começaram a brotar lojas de discos na Galeria feito uma epidemia. Achamos que era hora de mudar e fomos para outro endereço, na Rua Barão de Itapetininga, onde ficamos até 1993. O fechamento se deu por vários motivos; fizemos uma série de empreendimentos equivocados a partir de 1985, por culpa de nossa inexperiência e ignorância. As perdas foram enormes. Nossos erros foram agravados pelas medidas econômicas e as crises que aconteceram, que foram desastrosas para nós. O congelamento de 1987 e o confisco, por exemplo, foram duas punhaladas determinantes para nossa sorte.
Pergunta: - A Wop-Bop disputava com a Baratos Afins a fama de ser melhor a loja de SP e sua loja era mais charmosa. Não tinha mesmo como continuar com ela, mesmo depois do governo Collor?
René Ferri: - A Wop-Bop continuou por um tempo depois do plano Collor por teimosia e também por querermos achar uma solução. Afinal, grande parte de nossa vida havia sido dedicada a ela. Isso foi outro erro, pois a nossa insistência só fez agravar uma situação que era irremediável e definhamos. A Baratos Afins, eu acho, sempre foi uma loja muito melhor do que a nossa em todos os aspectos, principalmente pela capacidade que Luís Calanca tem de saber gerenciar superbem os negócios. Luís tem intuição, sagacidade, grande capacidade de trabalho e de realização e sobretudo tem uma visão de mercado invejável — quer dizer, tem tudo que nós não tínhamos e que nos fez muita falta. O charme que a Wop-Bop tinha vinha do Antonio, que é uma pessoa carismática e um relações-públicas nato, e de seus freqüentadores, disso tenho certeza. Lá, em um só dia, era possível encontrar escritores, jornalistas, músicos, editores e gente de todas as tribos. Era um ponto de encontro, um lugar de convívio, onde muitas amizades foram feitas. É por isso que, até hoje, as pessoas têm boas lembranças dela.
Pergunta: - Como nasceu a idéia de montar um selo?
René Ferri: - A idéia nasceu junto com a idéia de abrir a loja, assim como editar fanzines. Os primeiros fanzines, os primeiros ‘house organs’ no Brasil devem ter sido os da Wop-Bop. O selo demorou a sair porque nos faltou dinheiro. A coisa somente rolou em meados dos anos 80. Para se ter uma idéia de como éramos amadores, em 1977 “inventamos” a camiseta com estampa de rock. Isso não existia, exceto aquelas artesanais, pintadas a mão. Ninguém ainda dominava a técnica de silk-screen e foi um custo achar quem podia produzi-las para nós. Se tivéssemos enxergado o potencial desse negócio, poderíamos investir nele e enriquecer, até. Não só não aproveitamos a idéia como ajudamos outras pessoas a explorar o negócio.
Pergunta: - O selo também tinha um diferencial grande. Fabio Golfetti me contou que a proposta de vocês era muito mais interessante do que a da Baratos, quando eles iam gravar. Fale um pouco da proposta do selo, e se a repercussão e o retorno financeiro foram favoráveis...
René Ferri: - Honestamente, não sei qual seria esse diferencial, Fabio deve ter falado isso por simpatia, solidariedade e generosidade; se você conhece o Fabio, deve ter percebido que ele é quase um santo. Fabio e Antonio Bivar são as duas únicas pessoas que conheci que iluminam o lugar onde estão, onde quer que estejam. No selo, queríamos lançar artistas ou grupos iniciantes que tivessem grande potencial artístico e reeditar obras importantes, também. Mas o selo não deu certo, emperramos na distribuição que era a besta negra da produção independente. Acho que ainda é. A repercussão dos poucos títulos que conseguimos editar foi espetacular, com exceção do LP do Vzyadoq Moe. Editamos Violeta de Outono, Harry, May East, Vzyadoq Moe, Fellini e uma coletânea de ‘oldies’ (rock brasileiro pré-jovem guarda). O espaço que ganhamos na mídia foi algo realmente formidável. Não tivemos retorno financeiro nenhum, na verdade perdemos muito dinheiro com o selo.
Pergunta: - O que você pensa hoje da cena independente? Particularmente, acho um paradoxo que, em certos aspectos (locais para shows, espaço na mídia...) esteja pior do que nos anos 80? Você acha que houve um retrocesso?
René Ferri: - Tenho a impressão que ser independente hoje é o único caminho. Nos anos 80 era um dos caminhos, que podia ser uma opção ou um “estágio” onde o artista ficava até alcançar um nível mais profissional e com melhores condições. Não sei dizer se é um retrocesso porque estamos vivendo uma fase de transição, em que as gravadoras estão atarantadas, não sabem o que fazer nem como fazer para voltar a ter a força e importância de outras épocas. O futuro dirá se estamos regredindo ou se apenas estamos procurando uma forma de acomodar tudo de maneira diferente do que foi feito até a chegada do som digital e de seu “casamento” com a internet. Pergunta: - Seria a internet o novo "underground"?
René Ferri: - Não. Em relação à música, a internet é apenas uma forma nova de fazer, distribuir e ouvir música.
Pergunta: - Eu gostaria que você comentasse um pouco o que acha da nova cena roqueira brasileira? Eu não vejo mais uma nova safra promissora. Concorda com isso?
René Ferri: - Concordo. Mas é uma crise mundial. As gerações mais novas não querem saber de rock. Talvez o rock tenha morrido e não percebemos e nem queremos admitir isso. Se foi isso o que aconteceu, nada nos resta fazer a não ser esperar que no futuro o façam reviver. Isso não seria uma tragédia assim tão grande, pois grandes gêneros musicais, de grande sucesso, também morreram. Alguns foram revividos, outros não.
Pergunta: - No texto que você fez para os discos do Violeta, no relançamento 2 em 1, afirmou que nos anos 80 houve uma inexplicável explosão do gênero no Brasil. Passado 20 anos, ao que se deveu isso. Já tem alguma conclusão?
René Ferri: - Não me lembro em que contexto escrevi, mas se eu estava me referindo ao rock brasileiro dos 80, ainda acho um desafio explicar o motivo que fez surgirem tantas bandas de rock ao mesmo tempo, uma vez que foi um lance espontâneo. As gravadoras e a mídia, na época, custaram muito a perceber o fenômeno.
Pergunta:- Costuma acessar a comunidade Wop-Bop no Orkut?
René Ferri: - Para os dias de hoje, sou uma aberração. Não tenho telefone celular e nunca entrei no Orkut.
Pergunta: - Você não acha que, apesar dos jovens terem muito mais acesso à informação do que nós há 20 anos, eles são muito mais desinformados musicalmente?
René Ferri: - Lamentavelmente, sim! Mas eles não têm culpa. A desinformação é fruto da brutal massificação que atingiu os meios divulgadores de música no Brasil, o rádio e a TV, desde meados dos anos 80. São duas décadas, duas gerações de brasileiros vítimas da ganância de uns poucos. A massificação dá os melhores resultados comerciais a curto prazo, “eles” já provaram isso. Porém, a médio prazo produz um consumidor desinteressado, além de criar jovens desinformados e, por conseqüência, desinteressados também. Que cultura musical eles irão passar a seus filhos? É um lance meio canibal e meio autofágico. É um pesadelo. A luz do fim do túnel é a internet. Hoje, se lê mais e se escreve muito mais e as pessoas até por intuição procuram elas mesmas por mais informação. Isto é, se auto-educam. É a única saída, mas vai demorar pra caramba para reverter o processo.
Pergunta: - Você lançou três dos mais impressionantes discos daquela período - o EP do Violeta, o trabalho do Vzyadoq Moe e o Amor Louco, do Fellini. Conte como foram as gravações deles e o que se comentou quando saíram, por favor.
René Ferri: - A repercussão na mídia foi muito boa no caso do Violeta e do Fellini. No caso do Vzyadoq Moe, uma parte da mídia se omitiu por não entender o disco, acho eu. A gravação do Violeta foi feita num estudiozinho de jingles, que fez um trabalho fantástico. Já o disco do Moe nos deu a idéia completa do que é editar um retumbante fracasso. A gravação se deu no velho e superadíssimo Estúdio Eldorado, sei lá por que motivo. Acho que os músicos não levaram muito a sério o trabalho. A banda devia ser um brinquedo para eles. O corte do disco na RCA saiu ruim e ninguém percebeu ou fez que não percebeu. Conseguimos vender menos de 300 cópias. Foi o disco que mais divulgamos e o que menos deu retorno. Um fracasso completo.
O Fellini já era uma celebridade nos meios musicais paulistanos quando gravamos seu último álbum, Amor Louco. O disco foi gravado no então recém-montado estúdio de Miguel Barella e foi, provavelmente, o primeiro LP brasileiro digital. Os caras eram talentosos até demais, isso foi um empecilho para o Fellini ser acolhido pela grande mídia. O texto de Cadão Volpato é mil vezes melhor que o de Renato Russo ou Cazuza, para citar dois exemplos de autores incensados que surgiram na mesma época. O grupo não deixou seguidores porque sua proposta era elevada demais para os padrões medianos. A influência do Fellini foi aparecer bem depois no pessoal do mangue-beat. Hoje, só a rapaziada do Los Hermanos consegue fazer o que o Fellini fez nos anos 80.
Pergunta: - Fale, por favor, sobre os relançamentos em CD do seu catálogo... Alguns criticaram a má prensagem e os erros nos encartes.
René Ferri: - No final dos anos 90 fui acompanhar minha mulher numa visita que ela fez à Gorilla Groove. Para meu espanto, todos ali me conheciam e o Alex Cecci (grande figura humana) perguntou sobre os discos da Wop-Bop; respondi que estavam “espalhados” e ele propôs acharmos alguma empresa que os quisesse editar. Topei, porque naquela altura havia um grave risco deles simplesmente desaparecerem. Os dois anos seguintes foram um calvário – eu e Alex, muito mais o Alex que tinha os contatos, fomos enrolados e tratados com desdém, tivemos de lidar com os tipos mais desprezíveis, essa corja de sabidinhos, de aproveitadores sem caráter, essa canalha dissimulada e mentirosa que habita gravadoras grandes, médias e pequenas. Eu já havia passado por isso no tempo da Wop-Bop, daí concluo que há certas coisas na vida que simplesmente não mudam nunca. Depois de um ano eu já havia desistido e passei uma “procuração informal” para o Alex ir em frente. Graças a Deus, gente jovem é mais idealista e irresponsável do que nós e são eles que fazem as coisas andarem, mesmo que por caminhos tortos. Aí, quando eu já havia me conformado que a obra da Wop-Bop estava destinada a se perder, o Alex apareceu com a novidade: a RDS se propôs a editar 6 CDs. Autorizamos e a RDS por contrato arcou com todas as despesas de produção e fabricação, além dos ônus de pagamento de royalties às editoras e artistas, renovação das autorizações para edição de obras etc. etc. E assim foi feito. Aquele pequeno texto que acompanha os encartes e que fala de todos os discos é meu. A RDS fez as edições de texto e copiou dados das obras originais, em vinil, para colocar nos CDs, daí alguns erros de digitação e edição. Pedi para refazer a capa de Tabaporã, de May East, e André Hernandez fez uma capa nova muito melhor do que a original que não servia para as dimensões do CD. A capa de May East foi a única que passou pelas minhas mãos e revisei, os demais CDs só fui ver depois de prontos. Discordo que o som tenha saído ruim, acho que está até bem razoável. Os tapes estavam um em cada lugar e só o Alex pode responder como ele conseguiu localizar e juntar tudo. Em resumo, recuperar os discos da Wop-Bop e conseguir editá-los em CD foi quase um milagre.
Pergunta: - Deixe uma mensagem aos antigos freqüentadores da loja e obrigado pela entrevista.
René Ferri: - Não me acho capacitado para dizer mensagem alguma, além de um prosaico “alô, tudo bem?, muito obrigado por tudo”. Sou eu quem agradece pela oportunidade da entrevista.
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Sempre e bom lembrar das boas lojas, acho que esta geração esta perdendo muito em relação de como era se comprar musica no passado, e as pocas lojas estão acabando, este e o seculoXXI.
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Eu não sei quanto as outras bandas, mas eu não recebi sequer uma cópia do Fairy Tales para mim. Foi constrangedor, estando desempregado, ter que juntar dinheiro e entrar numa loja para comprar um cd da minha própria banda. Além do que, metade do material já era nosso, tinhamos comprado metade das faixas para usar na coletanea Chemical Archives, lançada pela Cri Du Chat em 95.
ResponderExcluirO Cesar chegou a contatar o pilantra da RDS explicando o caso e disse que não iamos criar encrenca, apenas pedimos algumas cópias do cd e nem isso conseguimos, embora o safado tenha se comprometido a tal.
Já quanto ao René, só tenho a agradecer, pois ele foi o primeiro a notar nosso potencial, mas ele tem razão: o pessoal de gravadoras é escória mesmo...
Meu primeiro Long Player (LP) do The Cure foi comprado na WOP BOP DISCOS depois foi um disco atras do outro virou um vicio passar na Wop Bop para dar uma olhada e acabar comprando, rsss.
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